Última obra escrita pela autora Clarice Lispector, A hora da estrela é um romance intimista, que percorre os pensamentos de seu narrador e de Macabéa, a personagem que pouco sabe de si mesma.
A hora da estrela começa com um desabafo do narrador, Rodrigo S.M, que deseja contar em detalhes a vida sofrida de uma nordestina, que um dia avistou na rua. Nesse relato, o narrador compartilha o processo de escrita, seus anseios e dificuldades em colocar no papel tudo o que precisa tirar de seu peito.
Escrevo neste instante com algum prévio pudor por vos estar invadindo com tal narrativa tão exterior e explícita. De onde no entanto até sangue arfante de tão vivo de vida poderá quem sabe escorrer e logo se coagular em cubos de geléia trêmula. Será essa história um dia o meu coágulo? Que sei eu. Se há veracidade nela – e é claro que a história é verdadeira embora inventada – que cada um a reconheça em si mesmo porque todos nós somos um e quem não tem pobreza de dinheiro tem pobreza de espírito ou saudade por lhe faltar coisa mais preciosa que ouro – existe a quem falte o delicado essencial.
O narrador nos conta a história de Macabéa, uma nordestina que perdeu os pais quando ainda era uma criança e foi criada por uma tia autoritária e ignorante, que sentia prazer em dar uns cascudos na sobrinha. Macabéa migra para o Rio de Janeiro e apesar de mal saber escrever ou ler, faz um curso de datilógrafa, profissão que lhe dará o mínimo para sobreviver. A sobrevivência; porém, não é nada fácil. A jovem divide um quarto com mais algumas meninas que trabalham em uma loja e para suprir sua fome engole pedaços de papel. Sua fonte de prazer se resume a escutar uma estação de rádio, tomar café frio antes de dormir e sair com seu namorado, Olímpico, também nordestino, mas com uma personalidade completamente oposta à dela. Macabéa não questiona a vida e aceita tudo o que lhe é imposto, um retrato da miséria, ignorância e falta de ambição.
Talvez a nordestina já tivesse chegado à conclusão de que vida incomoda bastante, alma que não cabe bem no corpo, mesmo alma rala como a sua. Imaginavazinha, toda supersticiosa, que se por acaso viesse alguma vez a sentir um gosto bem bom de viver – se desencantaria de súbito de princesa que era e se transformaria em bicho rasteiro. Porque, por pior que fosse sua situação, não queria ser privada de si, ela queria ser ela mesma. Achava que cairia em grave castigo e até risco de morrer se tivesse gosto. Então defendia-se da morte por intermédio de um viver de menos, gastando pouco de sua vida para esta não acabar.
A obra nos faz refletir a vida, a solidão e a escrita. E que prosa deliciosa a da Clarice. É o tipo de livro que sabemos que um dia iremos reler, porque há muito a ser absorvido. Já incluí outras obras na minha lista de desejos e espero ler alguns contos até o final do ano.
E você? Qual sua experiência de leitura da Clarice Lispector?
- Título original: A hora da estrela
- Número de páginas: 87
- Ano: 1977
- Gênero: Novela brasileira
- Rating: 5 estrelas
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